por Wálter Maierovitch
Usar o código penal e leis ordinárias complementares com
base na falsa crença de servirem para reduzir a demanda às drogas ilícitas
representa uma linha política fracassada no planeta. Os governos
norte-americanos, republicanos ou democratas, acreditaram nesse simplismo e,
perante as Nações Unidas, obtiveram sucesso e aprovaram em 1961 uma Convenção
Única de cunho proibicionista e ainda em vigor. Os Estados Unidos tornaram-se
os campeões de consumo e, na referida convenção, restou escrito que as drogas
proibidas seriam “erradicadas” em 25 anos. A convenção entrou em vigor em 1964
e o tal prazo findou em 1989. Para Alain Labrusse, do Observatório Francês,
“uma questão sanitária, de saúde pública, transformou-se em instrumento
regulador do equilíbrio mundial”. Para se ter ideia, segundo o Fundo Monetário,
o dinheiro derivado do narcotráfico, depois reciclado (lavado) principalmente
no sistema financeiro, representa de 3% a 5% do PIB mundial.
O mesmo caminho de ignorar o fenômeno e mesmo assim legislar
a respeito adotou o Brasil no projeto, já aprovado na Câmara, do deputado Osmar
Terra (PMDB-RS). Sobre o fenômeno das drogas proibidas, transcrevo as sempre
pertinentes e irrespondíveis colocações de Dartiú Xavier da Silveira,
médico-psiquiatra e professor da Unifesp. O artigo foi escrito em parceria com
Ilona Szabó de Carvalho, da rede Pense Livre:
“Enquanto o Ocidente vive um momento crucial no que diz
respeito a políticas de drogas, nas Américas um grupo crescente de líderes,
tanto da direita quanto da esquerda, clama por mudanças. Um novo relatório
divulgado pela Organização dos Estados Americanos em 17 de maio é enfático:
devemos nos mover em direção à descriminalização das drogas. O status quo vigente
mostra-se insustentável.
Descriminalizar não é legalizar. É tratar o uso das drogas
atualmente ilícitas como problema de saúde pública e não como crime.
O custo decorrente das políticas criminalizadoras e
repressivas para famílias e comunidades, e sobretudo para os jovens, é a razão
primordial para uma mudança de rumo. A América Latina responde por apenas 9% da
população mundial, mas sofre com mais de 30% dos homicídios globais, e suas
prisões estão superlotadas. Só no Brasil, cerca de 50 mil indivíduos são mortos
violentamente a cada ano, e já temos a quarta maior população carcerária do
mundo.
As políticas repressivas consomem verdadeiras fortunas.
Surpreendentemente, os verdadeiros investimentos sociais em prevenção e
tratamento, mais eficazes para reduzir o consumo e os danos causados pelas
drogas, são comparativamente insignificantes. Os profissionais de saúde
concordam que as políticas públicas devam se basear em evidências. Países como
Portugal, Suíça, Espanha e República Tcheca têm liderado mudanças a partir de
abordagens mais bem-sucedidas e menos danosas do que a simples repressão. E os
resultados são claros: menos mortes e doenças, menos corrupção, redução da
criminalidade e do poder do crime organizado.
No Brasil, infelizmente, velhas ideias sobrevivem,
sustentadas por desinformação e preconceito. Exemplo do nosso atraso foi a
aprovação, na Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei 7.663, de autoria de
Osmar Terra. O texto aprovado reforça o papel da política de internação
involuntária em entidades privadas, medida de exceção cara e pouco eficaz já
prevista em lei, em detrimento de investimentos no fortalecimento de uma rede
pública de tratamento da dependência.
Desde os anos 1970, os Estados Unidos já gastaram mais de 1
trilhão de dólares na “guerra às drogas”. E o que aconteceu dentro de suas
fronteiras? Atualmente, as drogas ilícitas são baratas e mais acessíveis do que
nunca. A taxa de dependência permanece no mesmo patamar de quando a guerra foi
declarada, atingindo perto de 1,3% da população. Hoje, os EUA possuem, de
longe, a maior população prisional do planeta, o que implica custos econômicos,
humanos e sociais gigantescos.
O proibicionismo fundamenta-se no medo e na crença de que
punir é mais eficiente do que informar, regular e tratar. Defendida por um
número cada vez menor de pesquisadores, essa abordagem é incompatível com as
boas práticas da saúde pública, que devem se pautar no pragmatismo, com base em
evidências, visando à redução de danos individuais e coletivos.
A OEA tem convocado todos os países das Américas para esse
debate. Não podemos ficar para trás."
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